Amores virtuais e sentimentos byteanos
Chegou a conclusão de que a única forma de encontrar o
seu príncipe encantado era por meio de sites de relacionamentos, especializados
em unir pessoas com características semelhantes. Moça tímida, recatada, criada
sob o rigor de um pai severo, nunca fora de sair, fazer amigos, paquerar.
Encontrar um namorado, dentro de casa, assistindo novela das 6, das 7 e das 8
seria humanamente impossível. Mas chegando perto do fúnebre abismo dos 30
anos, chegou a conclusão de que precisava mudar. E a solução seria acreditar
em amores
virtuais.
Acessou o site. O primeiro campo a ser preenchido era
“Apelido”. Um apelido, meu Deus! Mas que apelido? O apelido de criança? Nem
pensar. “Miss Pança” estava fora de cogitação. Assustaria qualquer pretendente.
Ela precisava de algo mais quente, mais sugestivo, mas sem ser extravagante
demais. Que tal “Donzela em Erupção”!? Não era o exemplo perfeito de
criatividade, mas não deixava de ser sincero. Se não fosse sincera agora, o que
dizer depois de iniciar um relacionamento? Mas na hora de preencher campos como
Idade, Altura e Peso, hesitou. Sinceridade
demais desgasta a relação, pensou, como uma especialista em relações amorosas. Por
isso, diminuiu idade e peso, e aumentou a altura. No campo Cantor (a) Preferido
(a), achou que Xuxa ia passar uma imagem ruim. Melhor Elis Regina. Homens gostam de mulheres cultas. Livros? Na
vida, ela só tinha lido Dale Carnegie. Por isso, arriscou um Patrick Sufind – embora ela tentasse se referir a
Patrick Süskind – que fora citado em alguma nota da Cláudia, mês passado. No
campo Sonho, chegou a conclusão de que se colocasse a verdade (aquela verdade
que cultivava ternamente desde seus 12 anos) de que queria casar e ter uma
ninhada de 3 ou 4 filhos, ah, aí sim ninguém se interessaria por ela.
No final das contas, havia mudado tantas características,
tantas referências, tantas especialidades que a “Donzela em Erupção” poderia
ser qualquer pessoa do mundo, menos ela.
Ficou deprimida ao perceber que, se ela agia dessa
maneira, ocultando suas características – encaradas como “defeito” sob os
exigentes olhos de mulher que imagina estar fadada à vida monástica – e
inventando outras qualidades; sim, se ela agia de tal forma, não seria difícil
imaginar que outros agiriam da mesma maneira. Em outras palavras: se recebesse
o e-mail dum jovem de vinte e poucos anos, atlético, olhos claros, nominado
Poeta Coruscante, deveria entender: coroa desorientado, barrigudo, consumidor
assíduo de espetinho e ovo cozido no Bar do Joca, e torcedor fanático do Grêmio
Maringá.
Pensou melhor. Bem melhor, por sinal. Fechou o navegador
sem salvar seu cadastro, e foi assistir emocionada, a mais uma eliminatória de
A Fazenda.